Defying Gravity

Eu vou falar, porque eu já devia ter falado antes. Vou falar porque agora não há razão para esconder. Vou falar porque eu não posso encerrar esse episódio da minha vida se ele estiver incompleto.

Eu não agüento mais guardar isso dentro de mim.

Foram meses desejando você. Eu olhei para você a primeira vez e senti as pernas trêmulas. Eu dificilmente me sinto assim, mas quando sinto, é pra valer mesmo. Eu devia saber que mesmo me mantendo afastada para respeitar o relacionamento que você já tinha não bastaria. Quando você libertou seu coração, meu amor quase me sufocou. Não pude evitar; eu tive esperanças.

Mas não tive muito tempo para manter essa esperança. Eu rezei. Pedi a Deus que me mandasse um sinal. Era pra ser? Não era pra ser? Eu estava no caminho certo?

Então ele me ouviu. O sinal não foi o que eu esperava. Você se foi.

E eu aprendi a acomodar esse amor dentro de mim, a me conformar em não ter você. É mais fácil aceitar que algo nunca vai se concretizar quando você está longe do que faz seu coração bater mais forte. É mais fácil aceitar que não vai dar.

Até que você estivesse novamente ao meu alcance. Ou fora dele, não sei bem. Agora era mais difícil aceitar que o amor não seria concretizado. Agora era mais difícil suportar.

Foram meses, querido. Meses sonhando com você. Meses não vendo a hora de te ver. Meses observando você e imaginando...  Suas mãos, como seria segurá-las num passeio comum? Seus olhos... Como seria acordar e vê-los tão próximos de mim antes de qualquer outra coisa? Como seria o meu dia depois disso?

Mil e uma maneiras imaginadas de como seria nosso primeiro beijo. Fantasias onde ficávamos sozinhos e você finalmente me notava. Como seria? Que textura seus lábios teriam? Você me olharia nos olhos? Você os fecharia logo? Você se entregaria totalmente? Como seria?

E a textura de seus cabelos. Sempre quis senti-los. Eles me atraem como tudo em você. Despertam minha curiosidade, minha vontade de cuidar de você.

Ah, meu amor. Foram meses orando para que Deus abrisse uma brecha em seu coração. Meses recebendo pequenos sinais de que aquilo não daria certo, de que esse amor nunca seria possível. Mas então você fazia uma pequena coisa... pequenos gestos que não me deixavam desistir de você.

Nunca foi proposital, eu é que estava iludida demais. Me desculpe por isso. Mesmo.

Mas agora tudo ficou claro pra mim. E eu prometo que vou deixar seu coração em paz. Pra que ele seja feliz. Enquanto isso, vou procurar quem possa fazer o meu feliz. Chega de ser inconveniente. Chega de sonhar e me iludir. Estou permitindo que esse amor se vá.

Então... acho que esse é um adeus.

              Srta. Mily

Epitáfio

Não tenho medo da morte. Podem me chamar de tola, ou de corajosa, talvez. A verdade é que eu não sei o que me espera do lado de lá - se há realmente algum lado de lá -, mas eu costumo olhar em volta e pensar... Se eu estou num mundo onde tantas pessoas morrem, se matam, se destroem, e tudo pelos motivos mais pessoais e inadmissíveis, por que temer o desconhecido? 

O conhecido por si só já é assustador.

Quando morrer, não chorem por mim. Não consigo viver num mundo onde rapazes são assassinados por beijarem outros rapazes. Onde mulheres são espancadas, crianças violentadas, inocentes passando fome, sede e frio. Não consigo viver num mundo onde os responsáveis pela segurança, saúde e educação do povo trocam tudo isso por um dígito a mais em sua conta bancária.

Quando eu morrer, rezem pelo meu espírito, para que eu possa encontrar a paz que aqui eu tanto sonho.

Quando a minha hora chegar, eu irei sem medo e sem tristeza. Até lá, vou fazer o que eu posso pra mudar tudo o que me assusta por aqui. Sou pequena, eu sei, mas plantarei cada semente de cada bom sentimento que eu tiver. Onde e quantas delas darem frutos já é uma vitória a mais a um mundo para o qual não parece ter esperança.